Tony amarra um de seus cadarços enquanto olha para o relógio
apreensivo. Já fazia bastante tempo que tinha esse caminho como habitual, mas os
minutos antes sempre o deixavam assim. Ele levantou-se, se alongou, trancou a
porta e começou. Primeiro caminhando, depois acelerando mais e mais até chegar
ao ritmo de costume. Já deixava para trás meio quilômetro, quando avistou a velha
lanchonete onde, quando pequeno, tomava sorvete com a primeira garota que fez
com que coração acelerasse mais que aquela corrida. Ver esse lugar o fazia
sorrir diariamente. Dois quilômetros e alguns metros, já sentia cansaço nas
pernas. A paisagem era verde e o outdoor que anunciava o serviço do melhor
advogado da cidade era quase um crime em meio a tanta beleza natural, mas o
fazia lembrar-se do passado. De quando o homem de terno estampado no cartaz era
só mais um colega, porem o colega que o apresentou a mulher que o tornaria
homem, uma bela mulher de cabelos vermelhos. Três quilômetros, as pernas
formigam, a vista embaça e assim que avista novamente vestígios da cidade o
cheiro de pão fresco o faz lembra que foi na padaria de onde esse vinha que comprou
o mais belo e maior bolo branco que já vira em uma festa, o de seu casamento.
Quatro quilômetros. Ele pensa que já está cansado demais pra continuar, mas
supera esse pensamento e as pernas se tornam tão automáticas que toda dor some.
Nesse quilometro não havia nada em especial, as casa eram feias e sem vida. E
isso o fazia se perguntar: “Por que deixei a chance de ter uma vida inteira ao
lado da primeira garota que fez meu coração acelerar, pra quem comprei um bolo
branco enorme anos depois, por apenas mais uma noite com a garota de cabelos
vermelhos?”. Ele não tinha respostas para essa pergunta, por isso o nada o fazia
lembrar-se disso. Seu quinto quilômetro estava acabando e então ele avistou um
banco. Ele sempre lhe dava vontade de parar para descansar, e assim ele fez.
Sentou-se e esperou olhando para os portões da escola a sua frente. Os portões
se abriram e no meio da multidão de crianças, uma linda garotinha de cabelos
escuros veio em sua direção e o abraçou. Enquanto apreciava cada segundo ao
lado sua filha, ouviu um automóvel buzinar alguns metros. Era ela, mais linda
que nunca. Ele via sua filha correr até o carro e depois esse indo embora na
estrada todos os dias e imaginava o dia em que suas pernas seriam fortes e sua
coragem grande o bastante para que ele levantasse, fosse a até o carro e
olhasse nos olhos dela mais uma vez, iniciando assim seu sexto quilômetro.
Texto dedicado ao meu
amigo Antônio L., mais um homem que precisa iniciar seu sexto quilômetro.